A visão espírita da violência











A onda de violência que assola o país tem merecido debates e análises diversas. O grau de insegurança aumenta com a exploração da mídia que, se de um lado desempenha o seu papel jornalístico, de denúncia e alerta ao cidadão comum, por outro, incrementa o pânico ao buscar o aumento de audiência à custa de tragédias pessoais, especialmente quando envolvem pessoas públicas e famosas. Foi assim com o seqüestro da filha do apresentador Sílvio Santos e depois com o próprio, tornado refém em sua própria casa. Foi assim com o assassinato do prefeito de Santo André e depois com a liberação do publicitário Washington Olivetto. Outros casos que causaram comoção foram os do menino João Hélio, arrastado até a morte pelo automóvel dos seqüestradores, e da menina Isabella, jogada da janela do apartamento, supostamente pelo pai e a madrasta.
A prova de que os Espíritos estavam certos ao dizer que é preciso o excesso do mal para se buscar o bem se faz presente mais uma vez. A primeira reação contra o nível de insegurança ocorreu quando uma organização criminosa orquestrou a maior rebelião penitenciária do país, atingindo simultaneamente cerca de 15 delas em diversas cidades. Era preciso investir em segurança pública e na construção de novos presídios, verdadeiros barris de pólvora por motivos de todos já conhecidos.
Das causas mais comuns listadas pelos especialistas – autoridades policiais, juízes, políticos, sociólogos –, temos: pobreza e desigualdades sociais, corrupção na polícia, causada por impunidade e má remuneração, falta de verbas e recursos tecnológicos no trabalho repressivo, descompassos metodológicos e burocráticos entre as atuações da polícia civil e militar e dentro do próprio judiciário, leis excessivamente brandas ou mal aplicadas etc.
Entrevistado em fevereiro por uma revista de grande circulação nacional, o sociólogo americano John Laub vai mais longe e, sem subestimar os fatores citados, afirma, por exemplo, que muitos abandonam a criminalidade motivados por uma ligação afetiva, o casamento, ou pela identificação com o trabalho. Relaciona ainda a educação e a religião. A seu ver, o casamento é o mais forte de todos, enquanto as pesquisas no terreno da influência da religião não seriam conclusivas. À primeira vista – diz –, as pessoas religiosas são menos propensas ao crime, mas como as crianças ligadas à religião são as mesmas que têm uma relação mais próxima com a família, já não se sabe qual dos dois fatores é o determinante.
O raciocínio está correto. Na verdade, o papel religioso, se considerarmos somente a atuação das religiões tradicionais ocidentais, é secundário e conseqüente à boa estruturação familiar. Em geral, um bom ambiente familiar é criado em parte pela prática religiosa e esta ajuda a disciplinar a vida das pessoas porque ministrada em lares de boa formação. É um ciclo virtuoso. Sozinha, isto é, fora do lar ou em condições econômicas miseráveis ou ambiente de contato com os vícios, nos moldes como ela, a religião, é ensinada e vivenciada, raramente logra êxito.
Diferente caso se analisarmos o valor de um conjunto de conhecimentos de ordem filosófica e moral, com respaldo científico como o Espiritismo. Uma vez que o indivíduo fosse informado adequadamente a respeito, principalmente, da reencarnação e da lei de causa e efeito – Deus e a sobrevivência da alma, embora mal explicadas, são princípios comuns a todas as religiões –, certamente se preocupariam mais com o seu futuro. Longe a ingenuidade de crer que ser espírita resolveria todos os problemas. É claro que a violência é o reflexo de uma situação conjuntural. A questão é que, no Brasil, até bandido acredita e pede ajuda a Deus.
Resumindo as respostas das questões 629 e 630 de O Livro dos Espíritos, vemos que moral é a regra da boa conduta, com distinção entre o bem e o mal, e tal é possível, pois que o bem é tudo o que está de acordo com a lei de Deus e o mal tudo o que dela se afasta. O bem e o mal, conforme a questão 636,sempre o são, mas há diferença quanto ao grau de responsabilidade que é proporcional ao conhecimento. Na questão 644, Allan Kardec indaga se o meio em que certos homens vivem não é o motivo principal de muitos de seus vícios e crimes. Sim – respondem os benfeitores –, mas tal é a conseqüência de uma prova escolhida pelo próprio Espírito antes de reencarnar; desejou expor-se à tentação para ter o mérito da resistência. Há arrastamento, mas não irresistível.
A questão 784 trata da perversidade humana intensa que, já à época, poderia afigurar-se como um recuo moral, mas ao que os Espíritos reclamam atenção para uma visão de conjunto. O progresso se dá pela melhor compreensão do que é o mal e pela correção de seus abusos. É preciso que haja excesso do mal para tornar compreensível a necessidade do bem e das reformas. Sábias palavras!
Parece-nos que é onde estamos no caso da violência. Há necessidade de uma mobilização geral da sociedade em prol da paz, porque a “guerra”, como a escuridão que só existe pela falta de luz, também se estabelece pela ausência daquela. Então a violência deve ser combatida de diversas formas, coercitiva e preventivamente, pelas autoridades e pelo cidadão comum, pela eliminação dos fatores citados e mais presentes nos discursos dos especialistas, mas, principalmente, banida dos corações dos homens.
A questão 785 da obra citada é clara: o orgulho e o egoísmo são os maiores obstáculos ao progresso e, sem dúvida, que o medo, a aflição, as agressões, seqüestros, estupros e mortes são indícios de atraso moral e distanciamento da felicidade humana. Particularmente diríamos que, talvez, mal maior que estes é a ignorância espiritual, fruto da falta da educação no sentido amplo. Assim, retornamos ao ponto de que os princípios espíritas, bem conhecidos e assimilados por um grande número de indivíduos, estabelecendo, se ou quando possível, larga maioria, e desencadeando um processo de conscientização sobre o nosso ser, estar e agir no mundo, traduzido na prática diária, por si só, transformariam a sociedade para melhor e resolveriam satisfatoriamente este como tantos outros problemas que nos afligem.
Somos egoístas e orgulhosos, tolos e arrogantes, corruptos e cruéis porque simplesmente ignoramos de fato quem somos (Espíritos imortais), de onde viemos (de Deus primeiramente, destinados à perfeição e felicidade; de outra dimensão e de vidas pretéritas). Por que estamos aqui (para promover o nosso reajuste de equívocos cometidos no passado e buscar o desenvolvimento espiritual) e para onde vamos (prosseguir no ciclo reencarnatório até que, pelo aprendizado sempre crescente, possamos dispensar tais experiências, quando então seremos praticamente Espíritos puros e dedicados auxiliares diretos do Pai).
Esta é a causa de tudo, a falta de espiritualização do homem. O resto, miséria, crueldade, egoísmo, injustiças, leis imperfeitas, fanatismo, desagregação familiar, ódios, corrupção e tudo o mais não passam de efeitos, mediatos ou imediatos.

Revista espírita O consolador