Um historiador ou antropólogo que visse espíritas em oração talvez associasse imediatamente esta prática com as religiões antigas e a magia primitiva, que propunham um tipo de vínculo ou comunicação com a(s) divindade(s). Ao mesmo tempo, hoje, dificilmente estes profissionais associariam o ato ritual de lavar as mãos dos cirurgiões com a prática ritual judaica, que se tornou objeto de controvérsias nos Evangelhos.
Hoje se acha incorporada ao senso comum a ideia de micróbios e outros microorganismos, que já foi objeto de ridículo na História da Medicina. Talvez por isso ninguém mais se recorde do tempo em que lavar as mãos era apenas um ato de fé ou um respeito à tradição.
O trabalho de Allan Kardec está repleto de comunicações de espíritos que solicitam aos espíritas franceses que orem por eles, e alguns casos são estudados, mostrando o efeito das preces sobre o psiquismo do desencarnado.
Um dos casos que se acha documentado intitula-se "o espírito de Castelnaudary" e pode ser lido no livro "O Céu e o Inferno". Castelnaudary é uma cidade no sudeste francês, próxima a Tolouse, na qual se encontrava uma casa considerada assombrada e exorcizada em 1848, sem qualquer diminuição dos fenômenos, um dos quais foi uma bofetada de mão materializada na face de um herdeiro do imóvel.
Os membros da Sociedade de Paris evocaram o espírito que habitaria nesta casa em 1859 e tiveram o apoio de São Luís para entender o que se passava.
O espírito evocado explicou tratar-se de um antigo dono, que cometera dois crimes naquela casa, vindo a falecer sem qualquer punição da justiça humana em 1659, com 80 anos. Sua imagem guardava relação com o estado íntimo: uma camisa ensanguentada e um punhal à mão, extremamente perturbado e violento.
Os colegas de Allan Kardec perguntam a São Luís como ficar livres deste tipo de obsessor, ao que o orientador espiritual responde ser necessário orar por eles.
Eles investigam mais a fundo a questão, perguntando se a prece sensibilizaria os espíritos ao mesmo tempo perversos e inteligentes. O mentor esclarece que para aproveitar a prece o espírito precisa arrepender-se do mal que tenha feito, mas que mesmo para este tipo de espírito se deveria orar, para que os pensamentos, mais cedo ou mais tarde, possam sensibilizá-lo e vencer seu cinismo.
Kardec relatou as comunicações deste espírito e de outros envolvidos com ele por dez sessões (duas delas na casa do Sr. F...), e destacou a coerência das informações fornecidas. O leitor consegue acompanhar as mudanças que se operam na consciência dele, as explicações que ele dá sobre os efeitos da prece e a evolução relativamente rápida que sofre, se considerarmos que se encontrava ligado ao local dos crimes por duzentos anos.
Este é apenas um dos casos relatados por Kardec em sua extensa obra. Faz-nos pensar mais sobre o efeito da oração sobre os espíritos e muda bastante a consideração da prece como ato automático ou de auto-punição, tornando-a um meio de comunicação e influência entre as almas.
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